Recentemente tenho tido o privilégio de trabalhar de casa, com a literatura e suas subdivisões, para alegria imensa do meu cachorro.
Isso significa que agora o telefone e a campainha são duas formas de ver o trabalho ser constantemente interrompido.
Ao telefone as cobranças. Não por mim, mas pelos antigos donos (vários) que estão devendo por aí, fazendo o aparelho tocar nas horas mais impróprias... tipo número 2.
A campainha é menos impessoal; são vendedores, religiosos, pedintes e aqueles que tem "oportunidades" para nos oferecer. A maioria deles acaba dispensada pela janela mesmo, a não ser aquele senhor que passa vendendo mandioca e alface de uma horta própria.
Mas numa manhã qualquer, um homem tocou a campainha. Ele trazia uma garrafa pet nas mãos. Fazia um calor considerável, mais de onze da manhã. O seu pedido? água!
Naquele momento me vi em uma situação complicada: como negar água a um outro ser humano? Mas eu estava sozinho em casa, ele poderia saber disso, poderia ser um golpe, poderia ser um bandido que se aproveitaria da minha bondade para me roubar ou coisa pior.
Pensei em passar a garrafa entre as barras do portão, mas são estreitas demais. Meu corpo tremia entre o medo e a vontade de ajudar.
Abri o portão, peguei a garrafa correndo, tranquei o portão e a abasteci na torneira. Senti a garrafa quente. A água dos canos estava aquecida pelo calor. Joguei-a nas plantas, peguei outra da geladeira e transferi para a pet, metade da água se perdia na minha tremedeira.
Voltei ao portão, garrafa em mãos, não mais vi o homem. Mais medo. Ele se sentara na calçada. O chamei. Ele pegou a água, agradeceu e foi embora.
E eu voltei para dentro desejando viver em um mundo onde possamos dar água para um estranho sem que sintamos medo...
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